"O Tempo Cura? O Jardim Interior e as Dores do Passado"
- agdagalvaopsic
- 3 de abr.
- 3 min de leitura

Diz-se com frequência: “o tempo cura tudo”.
Essa frase circula entre gerações como um consolo silencioso diante das dores da alma.
Mas será mesmo que o tempo, por si só, tem esse poder? Ou será que ele apenas oferece o solo onde algo mais precisa ser cultivado?
Na visão da Psicologia Analítica de Carl Gustav Jung, o tempo não cura — ele pode até amadurecer algo. E o que amadurece, inevitavelmente, confronta-se com a morte simbólica de antigas versões de si.
O tempo, nesse sentido, oferece o terreno e as estações, mas somos nós as jardineiras da alma: as que precisam plantar, regar, remover espinhos e acompanhar os ciclos.
Para Jung, o sofrimento psíquico não desaparece com o passar dos dias, mas clama por reconhecimento. Quando silenciado, não se dissolve: se desloca. Torna-se sombra — essa parte rejeitada da psique que vive à espreita, buscando expressão nos sonhos, nos relacionamentos, nos sintomas e repetições de vida.
Imagine um velho jardim abandonado. Durante anos, ele ficou à mercê das estações. A primavera trouxe flores esporádicas, mas os invernos rigorosos acumularam folhas secas, galhos partidos e raízes sufocadas. À primeira vista, parece um lugar esquecido, mas abaixo da superfície, a vida pulsa. O tempo não curou o jardim. Ele apenas esperou.
Um dia, uma mulher decide atravessar o portão enferrujado e adentrar aquele espaço selvagem e descuidado do jardim…
Com a enxada na mão, o coração apertado e os olhos marejados, ela começa a escavar a terra... Cada golpe com a pá é uma memória difícil, uma marca emocional, uma história mal contada.
Ela encontra sementes que nunca germinaram e outras que brotaram em silêncio. Encontra também espinhos que ferem, mas que a ensinam o caminho. O jardim responde ao cuidado com uma lentidão amorosa. Nada ali é imediato. Tudo pede presença.
Essa mulher somos todas nós. E esse jardim é nossa psique.
Jung dizia que a tarefa mais nobre da vida é o processo de individuação — o retorno ao Si-mesmo, o centro da totalidade psíquica. Todavia, esse retorno exige que olhemos de frente para aquilo que fomos, com coragem e abertura simbólica.
O tempo oferece o cenário; o trabalho interior é o enredo.
Quando acreditamos que apenas "esperar" resolverá tudo, podemos acabar alimentando o esquecimento — não a solução.
Podemos construir muros, mas não pontes. O passado não se resolve no silêncio, mas no encontro com o seu símbolo, sua imagem, seu sentido oculto, na fala que é verbalizada e escutada.
Na verdade, não é o tempo que cura: é a consciência que transforma. É a escuta da alma que integra. É o gesto simbólico — às vezes um sonho (ou muitos) analisado e compreendido, uma lágrima não contida, uma história finalmente contada — permite que a dor antiga se transforme em sabedoria na caminhada da individuação.
Como nos contos de fadas, onde o herói deve descer ao submundo para encontrar a verdade e retornar mais inteiro, também nós somos chamadas a mergulhar em nossas vivências marcantes — não para mudá-las, mas para dar-lhes um lugar digno no solo fértil do nosso jardim interior, onde até as dores podem se transformar em flores raras.
Ao final, a mulher do jardim não removeu todas as pedras nem eliminou todos os espinhos. Mas, ao retornar ao mesmo espaço meses depois, viu flores desabrochando onde antes só havia terra endurecida. E compreendeu: foi sua presença — não o tempo — que fez florescer.
Que possamos, então, cultivar nossos jardins internos com consciência, sensibilidade e coragem. O tempo é apenas o relógio do mundo. A alma tem seu próprio ritmo — e exige presença, não pressa.
E você? Como está o seu jardim interior? Já parou para perceber o que floresceu com o tempo e o que ainda aguarda cuidados?
Você sente que não consegue entrar nesse jardim sozinha? Que a poda, o replantio e o silêncio da terra às vezes pesam?
Se for assim, agende uma sessão comigo. Vamos juntas transformar dores em sabedoria viva. Nos vemos ali — onde as raízes da psique encontram a luz da consciência...
Caso deseje, compartilhe nos comentários o que esse texto despertou em você.
Autora: Agda Galvão
Psicoterapeuta Junguiana
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